Saudades que não passam
sexta-feira, 18 de outubro de 2013
A história é a memória de um povo
domingo, 10 de julho de 2011
Indico-te um imperdível filme argentino.
Para tua alma sedenta por alimento e escuta.
Me parece
sábado, 9 de julho de 2011
Me parece que hoje em dia nós somos o que temos
Me parece que não importa mais o ser, mas sim o ter
Me parece que a alegria tomou forma e o amor perdeu paixão
Me parece que a tristeza está efêmera e a raiva está com medo
Me parece que o mundo está acabando e as pessoas nem aí
Me parece que essa gente é pouca gente, mesmo dentro de tanta gente
Me parece que a criança não quer mais ser herói, ela quer ser muito rica
Me parece que a vida é mais pequena, mesmo em anos ser maior
Me parece que a poesia perdeu espaço, mesmo o mundo mais solitário
Me parece que o beijo de cinema perdeu lugar pra violência da razão
Me parece que os sentimentos são escassos e a vontade agora é líquida
Me parece que o dinheiro vem e vai, e as personalidades vão e vem
Me parece que mais me vale escrever para não chorar
Mas me parece tanta coisa que nem sei como continuar.
O Menino Dançarino, de Camila Scherma
domingo, 3 de julho de 2011
O MENINO
Os pés de milho balançavam ao ritmo do vento. Silêncio. Os passos do menino eram ouvidos já agora e o som deles ia aumentando e ficando mais próximos. Com os braços curtos e finos afastava as folhas e os olhos ávidos checavam ainda pela última vez se não havia ninguém por perto. Já entre os pés de milho, as folhas iam se fechando atrás do menino, que agora se preparava para o espetáculo. Uma espiga servia-lhe de microfone, a plateia era composta pelos pés de milho, únicos espectadores de espetáculos únicos. A voz do menino se soltava da garganta e ecoava o desejo de ser artista. Os braços se levantavam, os pés giravam, a cabeça para trás, para cima, para um lado, para outro. O corpo rodopiava, chacoalhava-se, corria entre as plantas-plateia no milharal. Cantava. Dançava. Interpretava. E no meio do espetáculo os sonhos se alimentavam daquela seiva de menino que não tem medo de se ver outro, como um homem das artes. Sonhava. No fim do espetáculo, os pezinhos descalços do menino iam pisando a terra satisfeitos do show que haviam ajudado a apresentar. As mãos agora já não seguravam a espiga-microfone para dar conta de afastar do rosto sonhador as folhas cortantes. O milharal agora ficava para trás, escondendo o palco que abrigava os momentos de cantor, ator e bailarino do menino. E o cotidiano pacato desse menino ia conhecendo minutos do extraordinário. Um extraordinário que rompia esse cotidiano ao mesmo tempo em que projetava um futuro para o protagonista dos espetáculos aos pés de milho.
O menino já não mora mais ao lado de sua mais fiel plateia. O milharal já não é mais vizinho nem espectador do menino. Mas a semente do artista ainda conserva em si a força para germinar e crescer no homem dos palcos e das artes. Os palcos agora têm cortinas vermelhas. Os microfones agora já não têm mais grãos amarelos e propagam a voz do menino a uma plateia diversa da dos tempos de miúdo. Os braços ainda se levantam e giram e balançam e alcançam sonhos cada vez mais concretos. A cabeça ainda sobe, desce, gira, pensa, sonha. Os olhos abrem suas cortinas e revelam o brilho que reflete a satisfação dos pés que agora pisam outros palcos, outras estradas, outras terras. A boca propaga um jeito de ver o mundo como muita gente não vê. Os ouvidos ouvem vozes como aquelas do filósofo russo que em tudo ouvia vozes. E o menino dança, rodopia, pula, corre, ri, olha e vê. A plateia aplaude, se levanta, aplaude, aplaude e vê. Vê o menino. O menino que ainda dança. Dança com a vida. O extraordinário agora não rompe só com o cotidiano do menino em seu palco secreto. O extraordinário agora vai aparecendo no cotidiano daquela plateia que participa dos sonhos do menino. Co cotidiano e o extraordinário. Um extraordinário cotidiano de lutas, de batalhas, de trabalho, de derrotas. Um extraordinário cotidiano de busca por forças que sejam capazes de constituir o menino.
Bem longe desses novos palcos, nessas terras distantes e diversas, o milharal repousa no silêncio. Sem som, sem dança, sem os sonhos. Mas o primeiro palco do menino continua lá. A plateia do menino continua lá, em pé. Pronta para os aplausos. Mas... e o menino? O menino? ... Eis o nosso menino: é homem já. E não é que ele voltou doutor?
Sobre a autora: Camila Caracelli Scherma. É doutoranda em Linguística pela UFSCar - Linguagem e Discurso. Professora de Ensino Fundamental na Cidade de Leme/SP.
Sobre o Menino: O crônica poética acima é sobre Hélio Márcio Pajeú, também doutorando pelo programa da UFSCar. Pernambucano. Ator. Dançarino. Que quando pequeno ao sair do sertão prometeu ao pai voltar doutor para casa. E sabemos de perto que os passos que anda dando é de disciplina, mas promotores de leveza e sorrisos aos que com ele convivem.
A bela menina da Régis
sábado, 2 de julho de 2011
Das mais belas estradas do meu país
Viajo na tortuosa e esburacada Régis Bittencourt
Ah ! Não é a toa que te chamam de morte
Maldita seja, que não me deixa ler nem ver
E a poesia aqui ? Sai mais torta que quando a estrada é reta
É, pois minha poesia não é das mais retas
E a maldita Régis, maldita seja ! Atrapalha mais !
A moderna pena mal encosta no papel
E lá vem buraco ! Malditos sejam os buracos !
Mas que ideia incrível esta minha
Escrever poesia no assento de um ônibus
Ah ! Meu caro leitor, não sabe o que é passear pela serra
Mas não me refiro ao passeio de chão não !
Me refiro ao passeio de versos que essa mata esconde
Passeios trilhados, magníficos e desgraçados
Onde somente o poeta é capaz de andar !
As pessoas da minha carruagem são quietas
Com exceção da linda criança que aos prantos chora
Criatura mais bela a criança, ingênua e sábia !
Diria que de todas as crianças nascem poesias
Mas seria dizer demais sobre algo que, de decifrar, sou incapaz...
Mais cedo disse a um grande amigo meu
Que clima melhor não há, que o frio da mata para ler um bom livro
É...gostaria de achá-lo agora para completar meu dizer
Pois clima melhor não há, que o frio da mata para escrever poesia
Meu ônibus saiu da serra e agora adentra às pequenas cidades do Vale
Ah ! Só lembranças me trazem essas cidades do Rio Ribeira
Saudades de quando fui criança como a bela menina que insiste a chorar
Naquela época não escrevia poesia
Mas posso dizer que minha mente, ingênua e sábia de criança
Fora capaz de produzir sorriso nas faces de mil e um poetas
Sei disso, pois a minha face não é outra que um belo sorriso
Quando escuto a linda menina chorar
Ela sabe que gosto dela, mas esconde o seu saber
Na inocência da idade
É...
No final das contas a Régis não é tão maldita
A Régis de hoje me apresentou um caminho tortuoso
Cheio de poesia, lembranças e uma linda criança
Não sei o nome dela, e sei que ela jamais lembrará de mim
Mas eu sei, que por toda minha vida
Dela hei de lembrar
E quando eu chorar
Vou querer sempre recordar
Daquela infância de algum tempo atrás
Quando eu era poeta e um pouquinho mais.